Cognição
Graziela Jorge Polido
@alegraespacoterapeutico
Você já se perguntou o que é cognição? É muito comum que pessoas que andam vejam pessoas em uma cadeira de rodas ou uma pessoa com deficiência e automaticamente pensem que ela não pode responder por ela mesma. Presenciamos isso quando a pessoa que anda direciona perguntas como “qual o nome dele?” para pessoa que está acompanhando o cadeirante ou, por exemplo, em um restaurante, quando pergunta para a pessoa que está junto, o que o cadeirante deseja comer. Infelizmente essas e outras atitudes capacitistas estão presentes em muitos momentos e são reproduzidas por muitas pessoas, este é um dos motivos do desenvolvimento deste texto. Saiba que para ler e compreender esse parágrafo anterior e até mesmo para buscar em sua memória momentos que você viveu algo similar você precisou usar a sua cognição, este é o outro motivo para a existência deste texto, explicar um pouco sobre o que é a cognição. Antes vamos à duas definições: cognição e atrofia muscular espinhal. A cognição está presente em tudo e ela envolve diversos aspectos como atenção, memória, solução de problemas, comunicação, percepção e ação. A AME (atrofia muscular espinhal) é uma doença neuromuscular e é dividida em cinco subtipos principais com base na idade de início e na melhor função motora alcançada. No tipo 0 ocorre a manifestação ainda na barriga da mãe ou logo ao nascimento e existem estudo que mostram que pode haver alteração cognitiva, mas essa é a exceção. O tipo 1 representa o fenótipo mais grave, com sintomas aparecendo até os 6 meses de vida. As pessoas com AME tipo 2 apresentam início dos sintomas entre sete e dezoito meses de idade e na história natural da doença, chegam a ficar sentada sem apoio. Pessoas com AME tipo 3 chegam a andar de forma independente, mas perdem essa habilidade ao longo do curso da doença. O fenótipo mais brando é o tipo 4, que se manifesta na idade adulta. Existem poucos estudos sobre cognição de pessoas com AME, os autores Osmanovic et al. (2020) encontraram desempenho cognitivo alterado, eles avaliaram 34 adultos com esclerose lateral amiotrófica (ELA) e 34 adultos com AME e sugerem uma possível alteração da cognição na AME, mostrando que pessoas com AME apresentam maior preservação da inteligência cristalizada, que é baseada no conhecimento e depende da educação, diferente da inteligência fluida, que corresponde à capacidade de resolver problemas. Os autores Polido et al. (2017 e 2019) também encontraram alterações cognitivas em crianças com AME quando comparadas com crianças com desenvolvimento típico, mas isso em circunstâncias específicas e o mais importante é a conclusão do estudo, que mostra que quanto mais ativa a vida social da criança, melhor a resposta cognitiva. Precisamos lembrar que qualquer pessoa se não estimulada adequadamente pode apresentar alterações cognitivas, então manter o cérebro ativo, uma boa interação com as pessoas e com o ambiente é o modo mais saudável de se desenvolver, brincando, estudando, fazendo coisas prazerosas! E porque falar disso tudo? Para reforçar o fato de que pessoas com diagnóstico de AME possuem uma alteração motora, ou seja, dificuldade para se movimentar, mas os aspectos cognitivos estão preservados ao nascimento, então quando você encontrar uma pessoa com AME, lembre disso e converse com ela. Claro que podem existir maneiras diferentes para se comunicar, uns falando com a boca, outros falando com sons que vem mais da garganta, outros falando com os olhos, não importa, desde que exista a comunicação e o respeito por quem o outro é, pela sua autonomia. Vale reforçar a importância de uma adequada reabilitação em conjunto com os novos tratamentos medicamentosos, mas principalmente lembrar que sempre o melhor estímulo é brincar!

Graduação em Fisioterapia pela Uniararas, especialização em neurologia infantil pela Unicamp, mestre em Ciências da Reabilitação pela USP. É fisioterapeuta do ambulatório de atrofia muscular espinhal do Hospital das Clínicas de SP e fisioterapeuta sócia/proprietária do Alegra Espaço Terapêutico. @alegraespacoterapeutico @grapolido
Sugestões de leitura:
Kolb, S.J.; Kissel, J.T. Spinal muscular atrophy. Neurol. Clin. 2015, 33, 831–846 https://doi.org/10.1016/j.ncl.2015.07.004 Osmanovic A, Wieselmann G, Mix L, Siegler HÁ, Kumpe M, Ranxha G, Wurster CD, Steinke A, Ludolph AC, Kopp B, Lulé D, et al. Cognitive Performance of Patients with Adult 5q-Spinal Muscular Atrophy and with Amyotrophic Lateral Sclerosis. Brain Sci. 2021, 11, 8. https://dx.doi.org/10.3390/brainsci11010008. Zappa, G., LoMauro, A., Baranello, G. et al. Intellectual abilities, language comprehension, speech, and motor function in children with spinal muscular atrophy type 1. J Neurodevelop Disord 13, 9 (2021). https://doi.org/10.1186/s11689-021-09355-4. Mix, L., Schreiber-Katz, O., Wurster, C.D. et al. Executive function is inversely correlated with physical function: the cognitive profile of adult Spinal Muscular Atrophy (SMA). Orphanet J Rare Dis 16, 10 (2021). https://doi.org/10.1186/s13023-020-01661-9. Polido GJ, Barbosa AF, Morimoto CH, Caromano FA, Favero FM, Zanoteli E, Reed UC, Voos MC. Matching pairs difficulty in children with spinal muscular atrophy type I. Neuromuscul Disord. 2017 May;27(5):419-427. doi: 10.1016/j.nmd.2017.01.017. Epub 2017 Feb 15. PMID: 28302390. Polido GJ, de Miranda MMV, Carvas N, Mendonça RH, Caromano FA, Reed UC, Zanoteli E, Voos MC. Cognitive performance of children with spinal muscular atrophy: A systematic review. Dement Neuropsychol. 2019 Oct-Dec;13(4):436-443. doi: 10.1590/1980-57642018dn13-040011. PMID: 31844498; PMCID: PMC6907703. Rodrigo Holanda Mendonça, Ligia Maria Sotero Machado, Carlos Otto Heise, Graziela Jorge Polido, Ciro Matsui, André Macedo Serafim Silva, Umbertina Conti Reed, Edmar Zanoteli, Motor unit number index (MUNIX) in children and adults with 5q-spinal muscular atrophy: Variability and clinical correlations, Neuromuscular Disorders, 10.1016/j.nmd.2021.02.019, (2021).